Todo Tempo Que Temos não é um filme para todo mundo ou que todos vão captar seus sub-textos. Em mim, ele tocou pontos que talvez não fossem sua intenção inicial tocar. Mas e aí, o filme vale seu tempo? A resposta mais honesta que eu consigo te dar é depende… Depende do seu contexto e experiências de vida, depende do seu ânimo no dia, depende do seu apego emocional àquela história que está sendo contada… Depende de como você quer absorver o filme.
Em termos práticos, o filme é um projeto do John Crowley com selo de distribuição da A24. O John Crowley já dirigiu Brooklyn, que eu acho um filme bonitinho, que brilha muito pela atuação da Saoirse Ronan. Outro filme que ele dirigiu foi O Pintassilgo, que eu particularmente não gosto. O filme, na realidade, é uma surpresa em todos esses aspectos. Eu fui ao cinema esperando algo e não encontrei. Por ser um filme com a chancela da A24, eu estava esperando uma direção de fotografia diferente, que eu só identifiquei em 3/4 cenas. No geral, a direção fotográfica caminhou muito para a luz natural e pouco color grading, o que honestamente não é ruim. Eu senti como se estivesse assistindo à vida de um casal de amigos, como se eu estivesse sendo uma observadora da história dos dois. Isso deve muito à proximidade da câmera e à iluminação sutil que foi usada.
Sobre a direção, eu não acho que ela brilha visualmente, mas funciona bem na direção dos atores. Os planos são clichês, não existe nada que quebre a sua atenção dos atores e da história, bem novelesco mesmo. O foco total da direção parece orientado para a atuação sutil dos atores, o que não é algo ruim, novamente te leva à imersão na história. Eles reagem como você esperaria que seu casal de amigos agisse, sem um drama dantesco, especialmente na parte corporal. É interessante que o filme é uma história pesada, mas pouquíssimas vezes os personagens são retratados chorando.
Por focar na direção de atores, eu acho que devo falar sobre a atuação deles e estou preparada para o hate, mas vamos lá… Eu não coloco hoje o Andrew Garfield dentro da lista de melhores atores de sua geração, especialmente pelo excesso. Ele geralmente tem aquelas expressões exageradas, um excesso teatral mesmo. Ele em alguns momentos me lembra muito o cinema da década de 50, onde o estilo de atuação mais expressivo visualmente foi gradativamente substituído por um estilo mais sutil. Nesse filme, ele perde um pouco dessa teatralidade e vai bem, mas nada extraordinário.
Quem brilha e toma o filme para si é a Florence Pugh, até porque o filme foca muito na personagem dela. Ela, diferente do Andrew, utiliza muito da sutileza para comandar o personagem. Você não vê excessos e se apaixona pelo charme da personagem, enquanto em algumas cenas, você a odeia, porque ela é extremamente humana e erra assim como qualquer pessoa. A atuação dela é o ponto alto do filme. Não acho que teremos Oscar, talvez alguma indicação no Globo, e se assim for, eu apostaria no nome dela. Mas definitivamente acho que ainda está faltando o papel “Oscar Made” para ela arrebatar a temporada de prêmios. Para mim, é uma das melhores atrizes da geração dela. Ela me passa a mesma sensação que eu tinha assistindo ao começo de carreira da Kate Winslet.
Bom, eu comecei falando que esse não é um filme para todos, um dos motivos é a expectativa. Você entra no cinema esperando um filme sobre um casal que é acometido por uma notícia de uma doença e nos primeiros minutos de filme você já descobre isso. Então, praticamente, você entende o final do filme com 10 minutos. Isso me despertou um sentimento de “poxa, é só um filme feito para a gente chorar?” O filme não surpreende, ele termina exatamente como você espera. E eu confesso que ao terminar o filme eu falei comigo mesma: “É, não chorei,” mas olhei ao redor e tinham pessoas literalmente passando mal de chorar.
O filme demorou alguns minutos para bater em mim e por motivos diferentes e inesperados. O sub-texto de Todo Tempo Que Temos aborda a vida de uma mulher de 34 anos que já viveu outros relacionamentos. Aquele não é seu primeiro amor, mas um amor mais maduro, com pessoas calejadas. Ela se sente realizada com sua vida e trabalho, não quer ter filhos e de repente o acaso muda o curso da narrativa dela. O que ela achava que tinha certeza, ela não tem mais. O que era dado como certo, não é mais. É uma mulher que começa a viver as incertezas de ser mulher, de como uma maternidade muda nossas vidas, vive os questionamentos de quanto tempo podemos esperar, eu quero isso para minha vida? Meu maior papel na vida será ser mãe? Ela se vê diante de todos esses questionamentos que nós mulheres fazemos nessa faixa etária.
Eu acho que por isso o filme fixa de formas diferentes em cada um e eu acredito que mulheres que vivem esses dilemas vão sair mais tocadas pelo filme. Com essas questões na cabeça, eu chorei, chorei como havia anos que não fazia, porque eu vi retratado de forma delicada os dilemas que nós mulheres vivemos em silêncio na maioria das vezes. O filme lida com isso de forma realista, suave, mas certeira, e toda essa suavidade é o ponto alto de Todo Tempo Que Temos.
Eu sei que o suposto tema do filme não era sobre o dilema de ser uma mulher e suas mazelas do mundo moderno, mas foi onde eu me encontrei… Eu me encontrei no sub-texto do filme. Então, voltando à pergunta inicial: Vale seu tempo? Vale, mas não vai mudar sua vida. Por isso, 3.5 estrelas para Todo Tempo Que Temos.